O Zika afeta a fertilidade masculina?
Pesquisadores dos CDC estão trabalhando com uma clínica de fertilidade em Porto Rico, país duramente atingido pela zika, para determinar se homens infectados pelo vírus têm redução na contagem ou alteração na função dos espermatozoides nas semanas e meses seguintes à infecção.
Esse estudo teve início no mês passado e até agora inscreveu apenas alguns homens. Um homem leva, em geral, cerca de 90 dias para produzir espermatozoides, por isso os pesquisadores planejam acompanhá-los por pelo menos seis meses para avaliar as alterações.
"Vai ser importante para nós acompanhá-los durante vários meses para comprovar ou descartar quaisquer efeitos da infecção pelo Zika", diz Tyler Sharp, epidemiologista-chefe da divisão de dengue dos CDC em San Juan, Porto Rico.
A razão pela qual os pesquisadores estão preocupados é que, nos últimos meses, três estudos separados documentaram os graves danos que o vírus Zika pode causar nos testículos, pelo menos em ratos.
"É como se eles tivessem sido destruídos", diz a Dra. Kelle Moley, codiretora do Instituto de Ciências Clínicas e Translacionais da Washington University,em St. Louis. "Como resultado, resta um testículo que é cerca de um décimo do tamanho do testículo normal, não-infectado". A Dra. Kelle documentou o mesmo fenômeno em ratos, mas não esteve envolvida no estudo atual.
O mais recente estudo, divulgado por uma equipe de Yale e do Instituto Médico Howard Hughes, descobriu que o Zika afeta as células de Leydig, que produzem testosterona, um dos componentes hormonais da espermatogênese. Cerca de três semanas após a infecção os testículos dos ratos eram muito menores do que os daqueles que não foram infectados, e apresentavam níveis mais baixos de testosterona sérica.
Os estudos levantam a possibilidade de que a infecção pelo Zika possa ter impactos duradouros em homens. Já se sabe que o vírus pode causar malformações congênitas.
"Ninguém realmente correlacionou isto a infertilidade em homens", diz a Dra. Kelle, "mas a infertilidade não é algo que vem para o primeiro plano quando se tem um resfriado. Ninguém fará um espermograma em um paciente que tem febre, calafrios e exantema. Pode levar de 20 a 30 anos para sabermos se as pessoas ficaram inférteis pelo Zika".
Exantema, febre e calafrios estão entre os sintomas da zika.
Além de neurotrópico, o vírus Zika também parece circular no trato reprodutivo. Os pesquisadores documentaram que a infecção pode ser transmitida sexualmente, bem como pela picada de um mosquito infectado.
A equipe de Sharp relatou na última semana que o Zika pode permanecer no espermatozoide de alguns homens por alguns meses.
Sharp diz que até agora ele não soube de nenhum relato de caso do Brasil ou de outros países com surtos disseminados de zika, de efeitos reprodutivos ou redução de volume dos testículos nos homens. Ele afirma que está cético quanto a que o ocorrido em ratos esteja acontecendo também com humanos.
Ele afirma que, tipicamente, quando os cientistas usam ratos para estudar uma doença, é porque veem um efeito em seres humanos e querem estudá-lo mais de perto em um modelo animal.
"O que parece ter acontecido agora é o oposto disso. Temos efeitos observáveis em um modelo de rato, e agora estamos vendo se podemos encontrá-los em humanos. Isso não significa que eles não existam, mas, normalmente, a ordem é a oposta", diz ele.
A Dra. Kelle concorda com Sharp que os achados precisam ser confirmados em homens.
"Eu acredito que precisa ser estudado em nível populacional, e acho que isso é o que os CDC estão tentando fazer", diz ela.
A Dra. Kelle e colaboradores observaram o que aconteceu com os sistemas reprodutores masculinos em ratos nas semanas após a infecção com o vírus Zika. Eles descobriram que os vírus atacam as células responsáveis por fazerem uma espécie de barreira entre o espermatozoide e o sangue. Esta barreira é fundamental porque protege o esperma do ataque do sistema imunológico do corpo. Quando a barreira fica vulnerável, o sistema imunológico entra, e cerca de 21 dias após a infecção, diz a Dra. Kelle, resta muito pouco da arquitetura interna dos testículos.
Os ratos do estudo da Dra. Kelle, que foi publicado em outubro do último ano, tinham baixas contagens de espermatozoides, baixa testosterona e probabilidade muito menor de fecundar ratas.
O estudo mais recente encontrou o mesmo resultado, embora os pesquisadores acreditem que os testículos encolham porque o Zika faz um ataque direto sobre as células de Leydig, reduzindo a produção de testosterona.
Ryuta Uraki, pesquisador de pós-doutorado em Yale, afirma que outras questões permanecem, como por exemplo, se os testículos podem se recuperar após uma infecção por Zika.
"Queremos avaliar se lesões nos testículos podem ser revertidas depois que o vírus é eliminado e se a fertilidade pode ser restaurada," diz ele.
FONTES:
(http://portugues.medscape.com/verartigo/6500976)
Dra. Kelle H. Moley, codiretora do Instituto de Ciências Clínicas e Translacionais na Washington University,em St. Louis, Mo.
Tyler Sharp, epidemiologista chefe da divisão de Dengue dos CDC em San Juan, Porto Rico.
Ryuta Uraki, pesquisador de pós-doutorado, Yale University, New Haven, Conn.
Science Advances, 22 de fevereiro de 2017.
Nature, 31 de outubro de 2016.
The Canadian Journal of Hospital Pharmacy: "Zika Virus: Facts, Prevention Strategies, and an Informed Tourist Perspective."